Ontem, ocorreu em nosso país algo que ilustra muito bem como o Brasil ainda está aprendendo a ser uma democracia madura. Do que estou falando? Refiro-me ao histórico editorial do jornal O Estado de São Paulo de domingo, declarando apoio a um candidato à Presidência da República.
Sempre foi normal, nas verdadeiras democracias, em lugares onde se entende absolutamente o conceito de liberdade de expressão e de imprensa, os jornais, além de fiscalizarem constantemente o governo, se posicionarem a favor de um candidato à Presidência durante as eleições. Somente no Brasil, uma jovem democracia, isso, que é tão natural nas demais democracias muito mais antigas, ainda causa espanto, porque se convencionou por aqui que se um jornal ou revista fizer isso alguma vez estará perdendo a sua credibilidade. A justificativa? “Jornal tem que ser imparcial”, “Jornal não deve ter lado”, “Jornal deve ser isento” etc.
Sim, é verdade que jornais têm que ser imparciais e isentos. Acontece, porém, que esses princípios, via de regra, são evocados de forma distorcida, por gente que interpreta equivocadamente o que significa, de fato, a imparcialidade e a isenção jornalísticas.
O princípio da isenção no jornalismo não significa ausência de posicionamento, mas o compromisso de se posicionar sem "segundas intenções"; o compromisso de se ater apenas aonde os fatos levam, em vez de ficar brigando com eles; a obrigação de opinar baseado no discernimento ético que se tem das questões ou eventos em apreço, independente de se sua posição vai concordar ou não com o que dizem A, B ou C.
Sempre foi normal, nas verdadeiras democracias, em lugares onde se entende absolutamente o conceito de liberdade de expressão e de imprensa, os jornais, além de fiscalizarem constantemente o governo, se posicionarem a favor de um candidato à Presidência durante as eleições. Somente no Brasil, uma jovem democracia, isso, que é tão natural nas demais democracias muito mais antigas, ainda causa espanto, porque se convencionou por aqui que se um jornal ou revista fizer isso alguma vez estará perdendo a sua credibilidade. A justificativa? “Jornal tem que ser imparcial”, “Jornal não deve ter lado”, “Jornal deve ser isento” etc.
Sim, é verdade que jornais têm que ser imparciais e isentos. Acontece, porém, que esses princípios, via de regra, são evocados de forma distorcida, por gente que interpreta equivocadamente o que significa, de fato, a imparcialidade e a isenção jornalísticas.
O princípio da isenção no jornalismo não significa ausência de posicionamento, mas o compromisso de se posicionar sem "segundas intenções"; o compromisso de se ater apenas aonde os fatos levam, em vez de ficar brigando com eles; a obrigação de opinar baseado no discernimento ético que se tem das questões ou eventos em apreço, independente de se sua posição vai concordar ou não com o que dizem A, B ou C.
O princípio da imparcialidade não envolve a não-autorização para declarar apoio a uma candidatura à Presidência; não envolve a ausência de opinião (Opinião faz parte da essência do verdadeiro jornalismo!); não envolve não ter lado. Significa, sim, que a imprensa secular não deve omitir os fatos e as opiniões que envolvem os dois lados (ou mais) de uma questão ou de um evento, e não que não possa opinar sobre os dados auferidos, definindo-se por um lado. Ela deve fazê-lo, e sempre objetivando a defesa dos princípios do estado democrático de direito. Se não fosse assim, não existiriam os editoriais. Afinal, porque e para que os editoriais existem, senhores?
Tomemos como exemplo a maior e mais antiga democracia do mundo: os Estados Unidos da América. Mais de cem anos antes de o Brasil se tornar pela primeira vez uma democracia, os jornais da maior e mais antiga democracia do mundo já faziam o que o jornal O Estado de São Paulo foi fazer só agora. Ali, desde o final do século 18, desde que o país foi declarado independente, os jornais, a cada eleição para presidente, escrevem editoriais dizendo quem apóiam e por que o fazem. Seguindo a tradição dos primeiros jornais norte-americanos (a maioria destes já desapareceu com o tempo), os atuais “jornalões”, as grandes revistas semanais e os pequenos jornais e revistas dos EUA ainda hoje fazem o mesmo. O Washington Post (fundado em 1877) e o Wall Street Journal (1889) já apoiaram tanto candidatos republicanos como democratas oficialmente em editoriais; o The New York Times (fundado em 1851) apoiou, na maioria esmagadora das vezes, democratas; o Chicago Tribune (fundado em 1847), sempre republicanos (a não ser em 2008, quando apoiou Obama, senador por Illinois, Estado do jornal); as revistas Newsweek (fundada em 1933) e Times (fundada em 1923 e inventora do conceito de revista semanal de notícias) já fizeram e ainda fazem o mesmo. A lista é enorme.
Porém, aqui, no Brasil, quando a revista Veja se tornou a primeira publicação a declarar apoio a um candidato à Presidência em editorial em 1998 (à época, apoiou Fernando Henrique Cardoso), isso foi visto como uma "heresia" jornalística, principalmente por aqueles acadêmicos de esquerda tão “entendedores” do que seja democracia e liberdade de expressão e de imprensa, a mesma gente que, via de regra, tece encômios a Guevara, Fidel e Chavez.
Pregou-se, à época, que a posição explícita de Veja tiraria a credibilidade da revista, mas a verdade é que ela, ainda hoje, mesmo tendo surgido outra grande revista semanal naquele período (a revista Época, do Grupo Globo), continua sendo a maior revista semanal do país, com tiragem por edição de 1,4 milhão de exemplares, sendo 1,1 milhão só para assinantes. E isso não significa dizer que eu concordo com tudo que Veja diz (Aqui mesmo, no blog, já contestei proposições de suas matérias e artigos), mas reconheço que Veja desempenha, no geral, um bom trabalho jornalístico, que faz com que, mesmo você não concordando com a abordagem de determinados assuntos, ainda a considere uma boa revista. O mesmo pode ser dito de Época e Istoé.
E é essa mesma liberdade de expressão e de imprensa que permite que revistas como Carta Capital possam fazer o mesmo que Veja fez em 1998. Ela nasceu com o propósito de ser a anti-Veja e defensora de Lula e do PT, como a esperança de ser um grande contraponto de caráter esquerdista em relação às demais revistas. Entretanto, sua proposta nunca foi bem aceita pelo grande público. As pessoas ainda preferem Veja, Istoé e Época. Istoé tem tiragem de 400 mil a 500 mil exemplares por edição e Época, de 450 mil, embora já tenha chegado a 700 mil. Enquanto isso, a tiragem de Carta Capital não ultrapassa a marca de 80 mil exemplares por semana. Outra revista esquerdista, a Caros Amigos, tem tiragem mensal de apenas 50 mil exemplares. Porém, tanto Caros Amigos quanto Carta Capital conseguem se manter porque contam com o governo federal como seu mais forte anunciante (enquanto a maioria esmagadora dos anunciantes de Veja, Época e Istoé sempre foi da iniciativa privada, seja na época de FHC, seja na época de Lula).
A ligação ideológica de Carta Capital se torna ainda mais explícita à medida que, no site do PT, durante muito tempo, a revista aparecia com 50% de desconto para assinantes para quem apresentasse a carteirinha de filiado do PT. Com isso, ela conseguiu aumentar sua tiragem para 75 mil exemplares, sendo 60% dela (45 mil exemplares) de assinantes.
Perceba: Não é curioso que quem odiou Veja pelo editorial pró-candidatura de FHC é a mesma turma que aprecia Carta Capital? Ora, se fôssemos aplicar ao caso da Carta Capital o mesmo critério usado contra o editorial de Veja em 1998, Carta Capital também deveria ser reprovada, devido ao seu lulo-petismo. A revista Caros Amigos, idem.
Na verdade, a grande oposição à Veja não se deve ao fato de ter se posicionado a favor de um candidato específico, mas ao fato de ela ser antipetista (Por razões com as quais concordo). Se ela fosse petista, essa turma se calaria. Tanto é que, como Carta Capital é petista, logo, para os mesmos que criticaram Veja por se posicionar em prol de um candidato à Presidência, Carta Capital é vista como uma “boa revista”. Para Lula, então, só deveriam existir publicações como Carta Capital no Brasil. Fidel já resolveu esse "problema" há muito tempo em Cuba e Chavez está em processo avançado para conseguir o mesmo. Os Kischner, que se aliaram a Chavez há mais de cinco anos, estão tentando o mesmo na Argentina. O jornal Clarín que o diga!
A democracia deve comportar a coexistência de Veja, Carta Capital, O Globo, Caros Amigos, O Estado de São Paulo, Istoé etc, e que o povo tenha o discernimento para concordar ou discordar da abordagem de um tema ou outro das matérias e artigos dessas publicações. É assim em democracias maduras.
Por isso, parabéns ao jornal O Estado de São Paulo, que se tornou ontem, 26 de setembro de 2010, o primeiro jornal do país a escrever um editorial apoiando a candidatura de um presidenciável – no caso, José Serra. Parabéns não exatamente porque escolheu Serra (Não que Serra não seja uma boa escolha - Escolher Dilma é que seria um erro!), mas porque teve a coragem de fazê-lo, abrindo um precedente excelente em nossa jovem democracia.
Quem se escandaliza com esse acontecimento não sabe o que é liberdade de expressão e de imprensa.
Tomemos como exemplo a maior e mais antiga democracia do mundo: os Estados Unidos da América. Mais de cem anos antes de o Brasil se tornar pela primeira vez uma democracia, os jornais da maior e mais antiga democracia do mundo já faziam o que o jornal O Estado de São Paulo foi fazer só agora. Ali, desde o final do século 18, desde que o país foi declarado independente, os jornais, a cada eleição para presidente, escrevem editoriais dizendo quem apóiam e por que o fazem. Seguindo a tradição dos primeiros jornais norte-americanos (a maioria destes já desapareceu com o tempo), os atuais “jornalões”, as grandes revistas semanais e os pequenos jornais e revistas dos EUA ainda hoje fazem o mesmo. O Washington Post (fundado em 1877) e o Wall Street Journal (1889) já apoiaram tanto candidatos republicanos como democratas oficialmente em editoriais; o The New York Times (fundado em 1851) apoiou, na maioria esmagadora das vezes, democratas; o Chicago Tribune (fundado em 1847), sempre republicanos (a não ser em 2008, quando apoiou Obama, senador por Illinois, Estado do jornal); as revistas Newsweek (fundada em 1933) e Times (fundada em 1923 e inventora do conceito de revista semanal de notícias) já fizeram e ainda fazem o mesmo. A lista é enorme.
Porém, aqui, no Brasil, quando a revista Veja se tornou a primeira publicação a declarar apoio a um candidato à Presidência em editorial em 1998 (à época, apoiou Fernando Henrique Cardoso), isso foi visto como uma "heresia" jornalística, principalmente por aqueles acadêmicos de esquerda tão “entendedores” do que seja democracia e liberdade de expressão e de imprensa, a mesma gente que, via de regra, tece encômios a Guevara, Fidel e Chavez.
Pregou-se, à época, que a posição explícita de Veja tiraria a credibilidade da revista, mas a verdade é que ela, ainda hoje, mesmo tendo surgido outra grande revista semanal naquele período (a revista Época, do Grupo Globo), continua sendo a maior revista semanal do país, com tiragem por edição de 1,4 milhão de exemplares, sendo 1,1 milhão só para assinantes. E isso não significa dizer que eu concordo com tudo que Veja diz (Aqui mesmo, no blog, já contestei proposições de suas matérias e artigos), mas reconheço que Veja desempenha, no geral, um bom trabalho jornalístico, que faz com que, mesmo você não concordando com a abordagem de determinados assuntos, ainda a considere uma boa revista. O mesmo pode ser dito de Época e Istoé.
E é essa mesma liberdade de expressão e de imprensa que permite que revistas como Carta Capital possam fazer o mesmo que Veja fez em 1998. Ela nasceu com o propósito de ser a anti-Veja e defensora de Lula e do PT, como a esperança de ser um grande contraponto de caráter esquerdista em relação às demais revistas. Entretanto, sua proposta nunca foi bem aceita pelo grande público. As pessoas ainda preferem Veja, Istoé e Época. Istoé tem tiragem de 400 mil a 500 mil exemplares por edição e Época, de 450 mil, embora já tenha chegado a 700 mil. Enquanto isso, a tiragem de Carta Capital não ultrapassa a marca de 80 mil exemplares por semana. Outra revista esquerdista, a Caros Amigos, tem tiragem mensal de apenas 50 mil exemplares. Porém, tanto Caros Amigos quanto Carta Capital conseguem se manter porque contam com o governo federal como seu mais forte anunciante (enquanto a maioria esmagadora dos anunciantes de Veja, Época e Istoé sempre foi da iniciativa privada, seja na época de FHC, seja na época de Lula).
A ligação ideológica de Carta Capital se torna ainda mais explícita à medida que, no site do PT, durante muito tempo, a revista aparecia com 50% de desconto para assinantes para quem apresentasse a carteirinha de filiado do PT. Com isso, ela conseguiu aumentar sua tiragem para 75 mil exemplares, sendo 60% dela (45 mil exemplares) de assinantes.
Perceba: Não é curioso que quem odiou Veja pelo editorial pró-candidatura de FHC é a mesma turma que aprecia Carta Capital? Ora, se fôssemos aplicar ao caso da Carta Capital o mesmo critério usado contra o editorial de Veja em 1998, Carta Capital também deveria ser reprovada, devido ao seu lulo-petismo. A revista Caros Amigos, idem.
Na verdade, a grande oposição à Veja não se deve ao fato de ter se posicionado a favor de um candidato específico, mas ao fato de ela ser antipetista (Por razões com as quais concordo). Se ela fosse petista, essa turma se calaria. Tanto é que, como Carta Capital é petista, logo, para os mesmos que criticaram Veja por se posicionar em prol de um candidato à Presidência, Carta Capital é vista como uma “boa revista”. Para Lula, então, só deveriam existir publicações como Carta Capital no Brasil. Fidel já resolveu esse "problema" há muito tempo em Cuba e Chavez está em processo avançado para conseguir o mesmo. Os Kischner, que se aliaram a Chavez há mais de cinco anos, estão tentando o mesmo na Argentina. O jornal Clarín que o diga!
A democracia deve comportar a coexistência de Veja, Carta Capital, O Globo, Caros Amigos, O Estado de São Paulo, Istoé etc, e que o povo tenha o discernimento para concordar ou discordar da abordagem de um tema ou outro das matérias e artigos dessas publicações. É assim em democracias maduras.
Por isso, parabéns ao jornal O Estado de São Paulo, que se tornou ontem, 26 de setembro de 2010, o primeiro jornal do país a escrever um editorial apoiando a candidatura de um presidenciável – no caso, José Serra. Parabéns não exatamente porque escolheu Serra (Não que Serra não seja uma boa escolha - Escolher Dilma é que seria um erro!), mas porque teve a coragem de fazê-lo, abrindo um precedente excelente em nossa jovem democracia.
Quem se escandaliza com esse acontecimento não sabe o que é liberdade de expressão e de imprensa.
4 comentários:
Pr Silas, é essa forma magistral de se fazer entender, que torna esse blog leitura obrigatória para os que buscam uma cosmovisão cristã.
No Amor de Cristo,
Fredy.
Pr Silas
Muito bom sua explanação.Isso é democracia! Mais um passo importante que aponte para esse objetivo(democracia madura)será quando o voto tornar-se facultativo.
Por que você não acha o canditado José Serra uma opção boa ou menos pior do que Dilma?
Paz em Cristo
Júnior
Caro Fredy, a Paz!
Obrigado pelas palavras de apreço e motivação.
Abraço!
Caro Junior, a Paz!
Prazer revê-lo aqui. Não estava querendo dizer que Serra não era uma boa opção, só que meus parabéns se direcionavam especificamente à decisão de "O Estado de São Paulo" se posicionar por um candidato, e não exatamente porque o candidato escolhido foi José Serra. Simplesmente, não queria entrar no mérito ainda se a escolha foi boa ou não. E o parênteses foi para deixar claro que, ao enfatizar que estava me referindo apenas ao ato de tomar essa decisão, não estava querendo dizer com isso que escolher Serra seria um mal, já que não-escolher Dilma já é um grande acerto.
Afirmo que Serra é uma boa opção sim, tanto quanto Marina Silva. Aliás, meu próximo post será sobre esse assunto. Para mim, quem votar em Serra ou em Marina está votando bem, dentro do princípio do mal menor.
De qualquer forma, foi bom você ter falado isso. Reescrevi o trecho ao qual se refere, e que sua pergunta revelou-me ter sido mal escrito por mim, por ter dúbia interpretação.
Aos queridos leitores: Ao final do penúltimo parpagrafo, antes eu havia escrito que se segue:
"Parabéns não exatamente porque escolheu Serra (Se bem que não escolher Dilma já é um grande acerto!), mas porque teve a coragem de fazê-lo, abrindo um precedente excelente em nossa jovem democracia".
Agora, está lá o que se segue, que melhor descreve o que eu quis dizer:
"Parabéns não exatamente porque escolheu Serra (Não que Serra não seja uma boa escolha - Escolher Dilma é que seria um erro!), mas porque teve a coragem de fazê-lo, abrindo um precedente excelente em nossa jovem democracia".
Abraço!
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