Como já é sabido por todos, a assembleiana Marina Silva, ex-ministra do Meio Ambiente, oficializou em agosto sua saída do Partido dos Trabalhadores (PT), ao qual estava filiada havia mais de 20 anos. No final do mesmo mês, depois de ser capa de algumas das principais revistas semanais do país devido à possibilidade de se lançar como candidata à presidência da República em 2010, ela oficializou sua entrada no Partido Verde (PV) e confirmou a possibilidade da candidatura à presidência da República ano que vem. Bem, desde então, alguns irmãos por e-mail e pessoalmente me perguntam o que acho sobre a possível candidatura da irmã Marina à presidência da República. De forma geral, posso dizer que é um fato muito positivo, apesar de particularmente não acreditar que ela possa ganhar o pleito do ano que vem. Claro que "muito água ainda vai rolar debaixo da ponte" até outubro de 2010, mas, por agora, tudo está caminhando para a eleição de José Serra, atual governador de São Paulo, à presidência do país, e não há indícios de que o quadro eleitoral mude muito daqui para lá.
Marina tem oscilado entre 6% e 8% nas últimas pesquisas, o que não é animador, embora uma pesquisa do Ipespe, pedida pelo PV e divulgada pelo jornal Valor Econômico de 26 de agosto, amenize sua baixa pontuação ao revelar que 59% dos eleitores brasileiros nunca ouviram falar de Marina Silva; só 7% dizem que a conhecem bem, 9% afirmam que a conhecem mais ou menos e 24% dizem que a conhecem apenas de ouvir falar. E segundo a mesma pesquisa, quando os entrevistados foram, ao final, informados sobre o currículo de Marina, as intenções de voto para ela subiram de 10% para 24%. Os únicos problemas com essa pesquisa são que o seu resultado final (24% para Marina) foi estimulado e que, um mês depois dela, quando o nome de Marina já é bem mais conhecido (depois de várias matérias em jornais, revista, tevê e rádio), ela ainda não ultrapassou a barreira dos 8%; além do que é preciso avaliar a variação dos votos para cada candidato após o eleitor ser submetido à propaganda televisiva de todos os candidatos. Entretanto, independente de resultados, a candidatura Marina já é uma das grandes notícias positivas das eleições em 2010. Por quê?
Em primeiro lugar, pela saída de Marina do PT - para mim, uma das melhores decisões de sua vida. Ela já não tinha quase nada a ver com o seu antigo partido, sendo sua permanência nele, a meu ver, já há alguns anos insustentável. Só por respeito a companheiros de décadas Marina tratou sua saída com extrema delicadeza (como, aliás, lhe é de praxe), demonstrando respeito à instituição a qual pertencera e à liderança desta em sua nota de despedida. Não creio que ela tenha sido tão respeitosa apenas por medo de o partido cobrar seu mandato.
A saída do PT era uma questão de tempo. Ela já não era mais a cara do PT. Se não, vejamos.
Primeiro, ela foi um dos poucos nomes de destaque do PT que saíram sem manchas após os escândalos do partido nos últimos anos. Contra ela pesa apenas o fato de ter ficado em silêncio diante de tudo.
Segundo, ela é contra a liberação do aborto e a descriminalização de drogas, duas bandeiras originais do PT (É verdade que não só políticos do PT defendem essas bandeiras, mas é preciso lembrar que o PT foi o primeiro a defendê-las e é até hoje o único partido que estabeleceu que quem é a ele filiado e não as empunha deve ser expulso do partido - vide o caso dos dois deputados expulsos recentemente do PT por isso. No caso de Marina, por ser um nome de peso, o PT fazia vista grossa em relação a ela e esta, por sua vez, não propagandeava sua posição contrária; mas, depois da saída dela, os processos que já existiam foram levados adiante e a "caça" aos pró-vida começou -
os deputados federais Luiz Bassuma e Henrique Afonso foram expulsos, e o deputado Flávio Arns, outro pró-vida, pulou fora do barco antes de ser expulso). No PV, há quem defenda essas bandeiras, como em outros partidos, mas não trata-se de uma resolução oficial do partido que, se não seguida, resulta na exclusão do filiado. Repito: só o PT, o pai dessas propostas no país, empunhando-as como bandeiras oficiais do partido desde os anos 80, é quem exclui seus membros que divergem nesses pontos.
Terceiro, as divergências entre Marina, o governo e Dilma Rousseff, e que resultaram em sua saída da pasta do Meio Ambiente. Desde essa época, sua permanência no PT se tornou definitivamente insustentável.
Em segundo lugar, considero a candidatura de Marina Silva uma das grandes notícias positivas das eleições de 2010 porque, ainda que ela não ganhe, sua presença, além de elevar o nível dos debates presidenciais do próximo pleito, desestabiliza ainda mais a candidatura Dilma Rousseff.
Em terceiro lugar, admiro muito a postura de Marina de ser totalmente avessa a qualquer espécie de "messianismo" em torno do seu nome. Foi importante a sua declaração "Não sou um projeto messiânico" já nas primeiras entrevistas sobre a possível candidatura.
E finalmente, em quarto lugar, posso ainda hoje não concordar com todos os posicionamentos da irmã Marina, mas, no geral, ela parece estar mais madura e equilibrada em relação a algumas posições outrora radicais que parecia assumir, o que nos traz alegria. De sorte que vejo-a "anos luz" à frente da maioria dos possíveis candidatos do ano que vem à presidência da República.
O caso Universal-Record
Sobre o caso envolvendo Universal e
Record, três pontos devem ser considerados.
Primeiro: esta não é uma guerra entre a
Globo e os evangélicos, como alguns tentam impingir. Trata-se de uma guerra entre o Ministério Público, a
Folha de São Paulo e a
Globo contra a Universal e a
Record.
Como anunciou em 2008 o colunista Lauro Jardim, da revista
Veja, em sua coluna eletrônica no site da revista, já circulava há algum tempo uma determinação da direção da
Globo para que se deixasse claro aos telespectadores de que a briga da
Globo não é contra os evangélicos, mas contra a Universal. Escreveu Jardim na ocasião: “Há uma recente instrução geral (não escrita) na
Globo sobre como tratar os evangélicos, vinda diretamente da família Marinho: adversária é só a Universal do Reino de Deus, de Edir Macedo – e não todas as igrejas evangélicas. Em sua programação, a emissora deve deixar claro que não discrimina os outros evangélicos. Essa demarcação terá que ficar nítida. A avaliação é que a Universal aproveita bem o embate com a
Globo para unir todos os evangélicos contra a emissora – e que a
Globo nunca conseguiu explicitar de modo patente que a sua guerra é com igreja de Macedo, a qual chama de seita. Na verdade, a
Globo nunca se preocupara com isso, que, afinal, parece meio óbvio, e botavam todos no mesmo saco. Resultado: há entre boa parte dos evangélicos o sentimento de que são discriminados pela emissora. Agora, ela tenta recuperar o tempo e a audiência perdidas”.
Meses atrás, a
Globo deixou isso bem claro ao fazer uma série de reportagens no
Jornal Nacional falando do excelente trabalho social que os evangélicos fazem no Brasil, mencionando o trabalho social das igrejas Assembleia de Deus, Presbiteriana, Batista, Metodista, Luterana etc. Outras matérias mostraram a parceria da
Globo na área social com pastores de igrejas no morro do Rio de Janeiro; o trabalho social das igrejas nas cadeias também foi alvo de matéria no Fantástico há alguns meses; e nos jornais televisivos locais, a
Globo fez também recentemente matérias sobre o trabalho social dos evangélicos e divulgou eventos evangélicos locais, como um que ocorreu aqui no Rio de Janeiro. Foram várias matérias de cunho positivo. E em mais uma demonstração de aceno aos evangélicos, um diretor da
Globo chegou ainda a dizer, em julho, conforme nota publicada no jornal
Folha de São Paulo, que uma das razões de a
Globo ter ultimamente retirado as cenas de nudez e sexo explícito da novela das oito é o respeito ao público evangélico (sic). Resta saber se essa ausência de cenas de nudez e sexo explícito vai permanecer ou é só temporária.
Pois bem, logo depois de todas essas demonstrações de aproximação em relação aos evangélicos, explode a denúncia. Isto é, a
Globo, ao que tudo indica, sabia das investigações que rolavam nos bastidores e procurou se precaver de possíveis ataques da Universal tentando arregimentar os evangélicos contra a emissora logo que as investigações viessem à tona, porque a
Globo não quer ter os evangélicos como inimigos (não por razões ideológicas, mas obviamente por razões comerciais). Por isso, antes de estourar a investigação, a preocupação em deixar claro aos evangélicos a seguinte mensagem: “Temos nossas diferenças, porém a nossa briga não é com vocês, mas com a Universal”.
Ou seja, não é uma perseguição aos evangélicos (como a Universal-
Record, por razões óbvias, quer que todos pensem), embora a
Globo e os que produzem seu conteúdo claro que ainda alimentam preconceito em relação a princípios e valores dos evangélicos que chocam-se com o liberalismo social defendido pela emissora. Aliás,
como escrevi recentemente aqui, essa aproximação da
Globo com os evangélicos não significa mudança de princípios, mas apenas aproximação por motivos financeiros.
Em segundo lugar, a razão dessa investigação é mais do que clara. Há uma guerra declarada entre o Ministério Público, a
Folha de São Paulo e a
Globo contra a Universal e a
Record fruto de rusgas passadas. A
FSP e a
Globo já tiveram problemas judiciais com membros da Universal (
aqui) e esta, por sua vez, já criticou o Ministério Público várias vezes. No caso da
Globo, a guerra de audiência é outro fator (se bem que, ultimamente, a
Record está se estapeando é com o
SBT).
E em terceiro lugar, quanto às acusações em si contra a
Record e a Universal, esperamos que tudo seja investigado até o fim e, se há irregularidades, que os culpados sejam punidos. O fato de as investigações serem motivadas por rusgas particulares não deve ser usado como cortina de fumaça para se esquecer a investigação das irregularidades apontadas. Deve-se ir até o fim e, repito, se as acusações se comprovarem procedentes, que todos os culpados sejam punidos. Discordo profundamente das posições teológicas e da práxis eclesiológica da Igreja Universal, mas isso não deve me levar a considerá-la culpada de antemão das acusações que agora são feitas. Tenho minha impressão e opinião sobre o assunto (particularmente vejo-a como culpada de todas as acusações feitas), mas a prudência manda esperarmos o julgamento.
Agora, independente do resultado, duas coisas são certas: primeiro, as posições teológicas e a práxis eclesiológica da Igreja Universal continuam sendo uma afronta ao verdadeiro Evangelho; e segundo, é uma contradição sem tamanho a
Record querer ser o “canal dos evangélicos” (se é que algum dia de fato desejou ser isso) e apresentar uma programação com uma qualidade moral pior do que a programação da rival, que não tem nada de evangélica. Sobre isso escreveu bem o
pastor e amigo Ciro Zibordi.
Enfim, nem a Globo agora é "pró-evangélicos" ideologicamente, nem a dupla Universal-Record parece ser uma mera vítima nessa história, e nem essa briga é nossa.